segunda-feira, 31 de março de 2014

São Carlos e o Golpe de 1964: nada para comemorar, nem para esquecer

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Nesse 1º de abril não vamos ter apenas mais um dia da mentira em que as pessoas costumam pregar peças umas nas outras. Nesse dia, completará 50 anos a maior e mais sem graça peça já pregada no povo brasileiro: o golpe militar de 1964. Essa não é uma data para se comemorar – muito pelo contrário, para se lamentar. Mas é uma data que não deve ser esquecida. Não podemos perder de vista a que ponto a burguesia e seus aliados podem chegar para defender seus lucros e interesses pessoais.

O regime que durou 21 anos foi responsável por milhares de exilados. Entre eles artistas, cientistas, jornalistas e políticos. As estatísticas mais céticas avaliam em um pouco mais de 350 os mortos pelo regime. Já as mais alarmantes, passam dos 1200. Se isso pode parecer pouco temos que pensar que equivale a um assassinato por mês, no primeiro caso, e no segundo um assassinato por semana – tudo isso durante 21 anos. O motivo? Discordar do regime (ou pelo menos ser suspeito de). Isso sem falar nos inúmeros casos ainda desconhecidos, nos torturados que sobreviveram, etc.




Golpe: por quem e para quem

No dia 31 de março de 1964, saía de Juiz do Fora (MG) e com o apoio de Magalhães Pinto (então governador do estado), o coronel-general do Exército Olímpio Mourão Filho. A marcha até o Rio foi ganhando adesões pelo caminho. O objetivo era derrubar o presidente João Goulart e a ameaça do comunismo, representado naquele momento pelas reformas de base propostas pelo presidente.

Mas o Brasil não era ponto fora da curva. A tensão da bipolarização entre o bloco ocidental e o bloco soviético e, em especial na América Latina, a Revolução Cubana (1959) tencionavam a situação internacional. A pós esse último fato os EUA já haviam lançado mão em 1961 da Aliança Para o Progresso para financiar o desenvolvimento e estabilização do capitalismo no continente. O que não descartava o apoio a golpes contrarrevolucionários.

Além da influência ideológica sobre a Doutrina de Segurança Nacional ensinada na Escola Superior de Guerra (ESG), é sabido que o governo estadunidense havia deixado instruções claras para o embaixador Licoln Gordon apoiar militar e logisticamente os golpistas (Operação Brother Sam e Operação Popeye). 

O empresariado, nacional e estrangeiro, assim como setores conservadores da Igreja Católica (Tradição, Família e Propriedade, por exemplo) não só apoiaram o golpe como também contribuíram para o regime entregando aos militares lideranças políticas, sindicalistas etc. Foi assim que em nome da preservação da ordem e da democracia instaurou-se no país 21 anos sangrentos de ditadura.


Em São Carlos não foi diferente

E para quem acha que essa coisas só aconteciam nos grande centros está enganado. Conforme foi revelado pela imprensa local, o empresariado e a Igreja em São Carlos eram grandes entusiastas do Golpe. No primeiro caso Ernesto Pereira Lopes (deputado federal pela UDN e dono das Indústrias Pereira Lopes [refrigeradores]) e seu irmão Mário Pereira Lopes (dono da Companhia Brasileira de Tratores [CBT]) detinham grande parte do poder econômico e político da cidade na época. Em 1968, pós-AI-5, tropas do exército cercaram a cidade para conter uma greve no Frigorífero São Carlos (da família Fialdini). Nesse mesmo ano, José Bento Carlos do Amaral, prefeito da cidade e eleito com 70% dos votos, foi afastado do cargo sem nenhum motivo alegado (1).

A Igreja local também não poupava esforços para contribuir com o golpe. Dom Rui Serra, então bispo de São Carlos, publicava frequentemente em jornais locais apoiando os militares contra o João Goulart, o “demônio impregnado do comunismo satânico de Marx”. Virgilio de Paulo, na época vigário da Catedral, também era abertamente apoiador da contrarrevolução. Chegava ao ponto de atacar setores da própria Igreja simplesmente por dedicarem-se a obras sociais (2).

Mas São Carlos não era um bastião unânime de apoio ao golpe. Aqui também haviam lutadores. Esse foi o caso de Lauriberto José Reyes, assassinado em 1972 durante uma troca de tiros na capital paulista. Lauriberto era estudante da Escola de Engenharia Politécnica (USP São Paulo) e militou na Aliança Nacional Libertadora (ALN) e no Movimento de Libertação Popular (Molipo). Ele foi preso em 1968 por participar do congresso clandestino da União Nacional dos Estudantes (UNE) em Ibiúna (SP). Ele também esteve envolvido com o desvio da rota de um voo da Varig para Cuba, em 1969 (3).


2014: 50 anos de impunidade

50 anos depois do golpe, muitas coisas mudaram. Os partidos, sindicatos e organizações estudantis puderam voltar a se organizar. As eleições foram restauradas o país ganhou uma nova Constituição. Mas embora todas essas mudanças, o país ainda tem sequelas. A começar pela impunidade. Torturadores e militares ainda não foram julgados, os arquivos não foram abertos e as empresas não foram responsabilizadas. Com todos os avanços, como o das Caravanas da Anistia, ainda resta muito por fazer.

Algumas leis da época ainda estão vigentes, como é a Lei de Segurança Nacional (LSN). Essa lei, que dava respaldo jurídico para as prisões arbitrárias do regime militar, ainda vigora hoje e é usada para prisões políticas, como acontece hoje no Rio Grande do Sul. Pós Jornadas de Junho e por conta das lutas pelo passe livre, ativistas estão sendo indiciados por formação de quadrilha e enquadrados na LSN. Somemos à isso o projeto de lei no Senado nº499 de 2013 (PLS 499/13) que quer criar a Lei Antiterrorismo no país. Nunca antes tivemos uma tipificação penal para esse tipo de crime e agora, diante da ameaça de protestos durante a Copa da FIFA de 2014, querem aprovar uma tão vaga que permitirá que qualquer movimento social seja enquadrado e punido com 30 anos de prisão por “prática terrorista”!

As ações truculentas e assassinatos também não foram deixados de lado. Basta lembra o que foi a ação da PM de Alckmin na desocupação do Pinheirinho. E não precisa ir longe. Altomani recebeu da mesma forma os sem tetos da Ocupação José Luis e Rosa Sundermann – com bombas e tiros de borracha. Se antes a ameaça era o comunismo, hoje existe a ameaça da violência, que resulta num massacre da população pobre e negra. Amarildos, Douglas e Cláudias são a prova disso.


Nada para comemorar, nem para esquecer

Não vamos nos esquecer. Nem se quiséssemos. Nossos familiares, parentes e amigos pagaram com a vida por esse regime e a dor não dos deixa esquecer. Simplesmente pelo fato de que queriam uma sociedade justa, democrática, igualitária e livre. Mas todas essas mortes e atrocidades não foram em vão. Elas no ensinaram que só a luta muda a vida. E se a luta foi quem derrubou a ditadura, seus resquícios vão ser combatidos da mesma forma: com muita luta!


Por
Romerito Pontes


(1) Especial “Memória: 50 anos do Golpe Militar” – publicado pelo Jornal Primeira Página nº6.928, 30 de março de 2014
(2) Idem.
(3) Revista Kappa, edição 85 nº 14.
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sexta-feira, 7 de março de 2014

Mulheres! Nós somos muitas, mas nossa luta é uma só!

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Por Bruna Quinsan

Somos todas Sandra Fernandes e Icauã Rodrigues, mortos no dia 17 de fevereiro a facadas em um crime de motivação machista: o ciúmes do companheiro de Sandra. Por quê? Porque em um país que ocupa a 7ª posição no ranking mundial da violência e onde 15 mulheres são assassinadas por dia, combater o machismo e a violência é lutar por nossa liberdade e por uma sociedade mais humana.

Somos todas trabalhadoras, e enfrentamos diariamente a jornada de exploração a que nossos patrões nos submetem. Porque é do nosso trabalho que vem a riqueza que eles gozam e de nós a educação de seus filhos. E não há empoderamento que compense esse saque.

Somos todas mães, e cuidamos sozinhas de nossos filhos. Não porque os fizemos sozinhos, mas porque o machismo nos obriga. Assim como nos obriga a cumprir a jornada dupla, ou até tripla, com trabalhos domésticos.Sofremos com a falta de creches e a precariedade das escolas públicas. Amarguramos só de imaginar a fila que teremos de enfrentar nos hospitais públicos. Somos todxs mães e lutamos por mais investimento na saúde e educação.

Somos todas negras, vítimas do machismo e do racismo diário. Vendidas como “mulatas”, objeto sexual para estrangeiros na Copa. Entre nós, o índice de desemprego é mais do que o dobro da média nacional, e quando estamos empregadas, recebemos 66% a menos pelo mesmo serviço realizado por um homem branco. Somos a maior parcela da população e por isso lutamos. Porque a nossa libertação é a libertação de todxs.

Somos todxs trans*, e se não bastasse todas as opressões já faladas, sofremos ainda com a transfobia. Oprimidas pelo simples fato se sermos o que nós realmente sempre fomos. Discriminadas simplesmente por querer decidir sobre o próprio corpo. Sem direito nem a um nome, lutamos.

Afinal, o que nós somos?
Somos todas feministas, classistas e de luta. Por quê?
Porque queremos nossa liberdade por inteiro!
Nada menos do que isso.

E nesse 8 de março, estaremos todas nas ruas!


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terça-feira, 4 de março de 2014

Nota do PSTU São Carlos sobre os recentes casos de repressão

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(Foto: Rodrigo Sargaço / EPTV)


Recentemente a cidade de São Carlos assistiu a mais um ataque do governo às trabalhadoras e trabalhadores da cidade. Um ataque não só político e econômico, mas também físico. Pois o que era para ser uma audiência pública terminou em violência policial.

Na sexta-feira (28/3) trabalhadores de uma empresa de limpeza terceirizada foram até a prefeitura reivindicar os três meses de salário atrasado. Eles alegam não terem recebido o salário, décimo terceiro nem férias. Algumas horas depois chegara também ao paço municipal algumas dezenas de pessoas que representavam as quase 200 famílias da ocupação do bairro Antenor Garcia. Estava marcada para o dia uma audiência pública para tentar buscar soluções mas o prefeito tucano Paulo Altomani não os atendeu.

Além disso, sem fugir a regra da política adota pelo governo federal de Dilma (PT) e do estadual de Alckmin (PSDB), quis resolver tudo com violência policial. A guarda municipal e a policia militar foram acionadas e o resultado disso foi além de toda a confusão, algumas pessoas machucadas – uma companheira do PSOL, inclusive, foi agredida e desmaiou. Ela foi levada ao hospital e já passa bem.

O caso não é fato isolado. E não só porque a gestão de Paulo Altomani em apenas um ano de existência já tem um histórico sinistro de casos similares, nem porque em sua breve existência já disputa o título de um dos governos mais impopulares das últimas décadas. Mas porque não tem sido diferente pelo país a fora.

Desde a nova situação política aberta com os protestos de junho de 2013 governos de diferentes matizes tem adotado a mesma resposta às exigências dos trabalhadores: repressão policial. Vide o PLS 433/13, que quer criar no Brasil a tipificação penal de terrorismo, tão vaga – diga-se de passagem – que serviria para enquadrar qualquer movimento social ou protesto. Fazem isso porque acima de suas “diferenças políticas” está a defesa das elites e da burguesia brasileira – fato que se materializa no financiamento privado das campanhas e na destinação de bilhões às obras da Copa.

Em especial, em São Carlos, vemos a precariedade da saúde, carro-chefe do caos na cidade; a ineficiência do transporte público, há quase 30 anos nas mãos do mesmo empresário; o subfinanciamento da educação, somado a episódios como o da demolição de uma escola no Zavaglia; a macabra estatística de uma mulher espancada na cidade a cada 8 horas, isso sem falar em casos como o do miss-bixete, na USP; e um longo etc.

Não temos a ilusão de que dentro dos limites dessa democracia nossos problemas serão resolvidos. É por isso indiscutivelmente que nos posicionamos ao lado das trabalhadoras e trabalhadores, apoiando-os em suas organizações e lutas. Repudiamos toda forma de violência e criminalização da luta dos movimentos sociais. Todas essas questões só poderão ser resolvidas em outra sociedade, que não a capitalista. Só a luta muda a vida. E é por isso que estamos na linha de frente.

Não à violência policial!
Todo apoio a luta das trabalhadoras e trabalhadores!
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