sábado, 22 de junho de 2013

Quem é o gigante que acorda?

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Mais de 20 mil pessoas foram às ruas no dia 20 em São Carlos.

Dia 20 de junho de 2013 – um dia para a história do país. Por todo o Brasil centenas de cidades pararam e tiveram suas ruas tomadas por manifestantes que se solidarizavam com os protestos anteriores nas capitais (brutalmente reprimidos). Os manifestantes também aproveitaram para levantar suas próprias pautas, em geral, por melhorias do transporte público.

Em São Carlos não foi diferente. Eram trabalhadoras e trabalhadores, estudantes secundaristas, universitários da USP e da UFSCar, sindicalistas, ativistas e partidários numa marcha que reuniu mais de 20 mil pessoas e que clamava por um país mais justo.


A primavera tropical

Um dos principais slogans que temos visto nos cartazes, principalmente nas redes sociais, para expressar o fato é a hashtag (para usar a expressão contemporânea) #OGiganteAcordou. Mas se enganam aqueles que pensam assim. E se enganam por dois motivos.

Primeiro porque o gigante não é do tamanho do Brasil: é do tamanho do mundo, do tamanho de toda classe trabalhadora, internacionalmente, do provo explorado e de toda a juventude que luta e sonha. E, assim sendo, erram também pelo fato de que esse gigante mundial não acordou agora. Ele já havia despertado em 2008 com a crise econômica dos subprimes.

Esse gigante espreguiçou seus primeiros membros com as greves gerais na Europa, contra os planos de austeridade e a Troika, com os mineiros espanhóis e com a luta do povo grego. Se espreguiçou também no Oriente Médio, onde a luta dos povos derrubou ditadores de décadas, e ainda derrubará mais, como na Síria e na Turquia. Se espreguiçou com a juventude do Chile, do Canadá e da França, na defesa da educação. Agora chegou a vez do Brasil, que se levanta contra o transporte público, as péssimas condições dos serviços público e dos gastos exorbitantes com a Copa. E o gigante apenas começa a levantar...


O Gigante atordoado

Mas tão importante quanto saber que o gigante acordou é saber para onde ele vai andar. E é nessa hora que muitos ativistas honestos ficam incertos e inseguros com os ares nacionalistas e despolitizantes que a direita, seja através de seus elementos fascisctóides ou da manipulação da mídia, tenta impor ao movimento popular. A imprensa defende com unhas e dentes o movimento pacífico, embora mostres incessantemente a derrota do pacifismo, alternando com cenas de violência e ódio aos partidos e organização de esquerda. Fazem, do alto de seus helicópteros, esse jornalismo antiético e sem contextualização para desmoralizar o movimento, pois no chão seus carros são queimados e seus repórteres hostilizados. Sabem que não são bem vindos.


Comunistas e suas bandeiras

Mas isso não nos assusta. E não vamos permitir um passo sequer para trás. Marx e Engels escrevem no final do Manifesto Comunista que 
Os comunistas não se rebaixam a dissimular suas opiniões e seus fins. Proclamam abertamente que seus objetivos só podem ser alcançados pela derrubada violenta de toda a ordem social existente. Que as classes dominantes tremam à ideia de uma revolução comunista ! Os proletários nada têm a perder nela a não ser os seus grilhões. Têm um mundo a ganhar.
E em 1923 Trotsky reitera, dizendo que
Os comunistas não temem a palavra “partido” porque seu partido não tem, nem terá, nada em comum com os outros partidos. Seu partido não é um dos partidos políticos do sistema burguês (...). Por isso, os comunistas não têm nenhuma razão - nem ideológica, nem organizativa - para se esconder atrás dos sindicatos.

É por isso que nem a Ditadura Vargas, que cooptou toda a malha sindical do país, nem os posteriores 15 anos de populismo; nem os anos de chumbo, com o AI-5 da ditadura militar, nem os mais de vinte anos de neoliberalismo que vivemos até hoje, foram capazes de fazer baixar nossas bandeiras. A luta por uma sociedade justa é axiológica, ou seja, não se esgota com os momentos de desgraça da humanidade.

O nosso partido sempre esteve nas ruas, e sempre vai estar. Queira a direita ou não. Nossos militantes sempre estiveram nas manifestações pelo passe-livre. Muito antes dos 100 mil, foram atos com 50, 30, 20 pessoas! Mas estávamos lá, pois jamais abrimos mão da luta. Foram os militantes de esquerda que mantiveram a pauta viva entre um ascenso e outro. Durante anos de “apatia”, nós estávamos lá, juntos com outras correntes de esquerda, enfrentamos a mais desmoralizante chacota e perseguição cotidiana, muitas vezes de pessoas próximas e familiares. E não vai ser agora, com o brado de grupelhos covardes e reacionários que prestam um desserviço com seus discursos de ódio, que vamos recuar – sequer um passo! A intimidação física nunca venceu a luta política.

"Não são por 20 centavos", diziam em São Paulo. Para além do transporte, toda a sociedade leva suas pautas.

Avançar para não retroceder

Na luta de classes, jamais se ganhou por W.O. Por isso, a atitude dos companheiros do MPL, se retirando das manifestações alegando “direitização” do movimento, pouco ajuda. Muito pelo contrário. É nessa hora que nossa militância é mais exigida. Dialogar apenas com uma vanguarda é relativamente confortável. Temos que superar essa acomodação e, obviamente, fora da zona de conforto, as dificuldades serão maiores. Mas não podemos nos deixar desanimar, achando que o atual ascenso é pouco promissor ou que a direita vencerá. Isso demonstra, talvez, que de uma hora para outra nos vimos obrigados a dialogar com uma quantia avassaladora de pessoas, e que talvez não estivéssemos preparados para isso. Mas jamais devemos achar que o movimento “já nasce derrotado”.
Manifestantes passam em frente ao Paço Municipal. A manifestação se estendeu por cerca de dez quarteirões.


Redução não basta! 

Em São Carlos, a luta dever ser agora, além de pela garantia do caráter democrático das manifestações, permitindo a presença de todas organizações e evitando uma “direitização” do movimento, pela elaboração de um programa mais claro, que nos garanta uma vitória concreta. Portanto, não basta dizer que queremos reduzir a tarifa. Temos que dizer como queremos.

Caso contrário, a redução será feita através das custas de outros setores, através de subsídios por parte do poder público, de isenções fiscais, ou na redução dos salários dos trabalhadores rodoviários. Além disso, não estão diretamente ligadas a redução da tarifa e a qualidade do transporte. Não basta reduzir a tarifa se as linhas continuam insuficientes e a logística um caos. Também não basta pedir o fim do monopólio da Athenas. É uma ilusão achar que se trocarmos um empresário por outro as coisas serão melhores. O mesmo serve para a hipótese de se trocar um empresário por vários em concorrência. Não se trata de uma questão de caráter. É uma questão de lógica – e para toda a classe empresarial a única lógica que há é a da lucratividade, custe o que custar. Não podemos cair nessas armadilhas!

Para termos um transporte acessível e de qualidade, o primeiro passo é deixá-lo de considerar mercadoria e vê-lo como direito, como o que realmente ele é. Precisamos então garantir o seu caráter público. Deixando de sustentar os lucros exorbitantes dos empresários, a passagem já poderia ser muito mais barata e o serviço de mais qualidade. Devemos lutar, isso sim, pela municipalização do transporte! Só assim poderemos controlar sua qualidade e seus preços, garantindo um transporte justo para todos, bem como o passe livre estudantil e para desempregados.

Terça-feira, às 12h, está marcado na praça do Mercadão um terceiro ato, que talvez não chegue ao tamanho do segundo. Mas deve, e lutaremos por isso, ser mais democrático e politizado, para avançarmos na elaboração de uma pauta, não só eficaz, mas que traga melhorias coerentes e duradouras para as trabalhadoras, trabalhadores, estudantes, desempregados, aposentados e todos aqueles que necessitam diariamente de um transporte público digno.

Estudantes da Anel também participaram do ato.

Obs.: aos que duvidam da viabilidade da tarifa zero, procurem as experiências de Hasselt, na Bélgica; de Sidney na Austrália, da Croácia, da China, das mais de 30 cidade dos EUA e, principalmente, pelas cidades brasileiras que já implantaram a tarifa zero. Nem todas são o molde que defendemos, mas sem dúvida são a prova de que é possível.

Por Romerito Pontes

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1 comentários:

Belo texto! E o blog está lindo!

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